REAÇÃO DO MpD SOBRE AS DECLARAÇÕES DO PR SOBRE O RELATÓRIO DO TRIBUNAL DE CONTAS

Monday, October 7, 2024

O MpD esclarece que é da exclusiva competência da Presidência da República a execução do seu orçamento, cabendo-lhe a inteira e exclusiva a responsabilidade pela cabimentação, pela autorização e pela liquidação. Esta responsabilidade não pode ser partilhada com mais nenhum outro órgão de soberania. 

É no exercício destas competências autónomas e exclusivas que a Presidência da República decidiu, à margem da lei, segundo o Tribunal de Contas:

  • Contratar e pagar um salário à sua companheira;
  • A contratar colaboradores sem concurso público;
  • Nomear mais assessores especiais do que a lei permite;
  • Pagar salário como Conselheira a alguém que nunca exerceu essa função na Presidência da República; 
  • Pagar serviços de massagem, assistência médica e consultas de psicologia;
  • Fazer adiantamentos de salários;
  • O Chefe da Casa Civil decidiu comprar (imagine-se) a si próprio uma obra de arte;
  • Pagar acréscimos salariais sem fundamentação plausível;

  • Celebrar contratos de consultoria que excedem o limite do valor estipulado no Código da Contratação Pública;
  • Pagar subsídio de compensação pela utilização de viatura própria.

Pelas reações de sua Excelência o Sr. Presidente da República fica evidente que, agiu em consciência, portanto, estava a par de tudo.

Assim, perante este volume significativo e inusitado de más práticas, totalizando mais de 25.000.000$00 (vinte mil contos) a serem repostos, só resta uma saída digna: a sua excelência o sr Presidente da República assumir, em pleno e em exclusivo, as suas responsabilidades. 

O Presidente da República não pode continuar a fugir às suas responsabilidades! É um imperativo ético, sobretudo, quando se trata do mais alto magistrado da nação, do guardião e garante do cumprimento da Constituição, do princípio da legalidade e das demais leis da República.

O ordenamento jurídico cabo-verdiano, pela a Lei n.º 13/VII/2007 de 2 de outubro, que aprovou a Orgânica da Presidência da República, tem definido e regulado a Casa Civil como responsável por todos os atos praticados pelo órgão da soberania Presidente da República, bem como que assegura a sua gestão administrativa, financeira e patrimonial. A referida Lei prevê, no seu art.º 2º, de forma clara e cristalina, que a Presidência da República tem total autonomia administrativa, financeira e patrimonial e presta contas, autonomamente, junto do Tribunal de Contas, que as julga, nos termos da lei.

No caso da orgânica da Presidência, tem de ficar claro que só o Poder Legislativo (portanto o Parlamento) pode o alterar. A Presidência da República não tem competência legislativa, nem, tão pouco, tem a iniciativa legislativa, portanto, nos termos das nossas Leis, o Presidente não pode criar cargos e não pode determinar salários. Muito menos pode o Presidente da República decidir contratar a sua companheira e atribuir-lhe um salário.

Sabendo disso, o Presidente surge com uma estranha tese: fazer da suposta boa-fé de uma proposta “fonte de direito”. O facto dele ter proposto ao governo uma nova orgânica para a Presidência da República, não lhe concede legitimidade para legislar, criando cargos, funções, salários, direitos e regalias.

É que mesmo aqui, no âmbito desta tese, a “cota não bate com a perdigota”, pois contratou a companheira em janeiro de 2022, tendo entregado a suposta proposta de nova orgânica da Presidência em maio do mesmo ano.

A nosso ver, esta tese só piora a situação, já por si só grave, porquanto expõe a Presidência no que se refere aos mais básicos princípios do direito público: “não é a lei que se deve adequar às vontades dos cidadãos e instituições, mas sim estes é que se devem submeter ao cumprimento das leis.”

A orgânica da Presidência da República é a que está em vigor – lei 13/VII/2007 e só o parlamento o pode alterar. É assim, nos Estados de Direito, é assim em Cabo Verde. Somos um Estado de direito!